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Com ou sem carnaval, não reforce estereótipos



Muito além do futebol, você já parou para pensar como o Brasil se tornou o país do Carnaval? A comemoração é a principal festa popular do mundo e está presente em diversos países. Acredite, também existe carnaval em Veneza, no México, em Aruba, no Canadá e - até mesmo - nas baixas temperaturas da Suíça, com suas canções típicas, fantasias tradicionais e ritos comemorativos específicos.


A festa brasileira é marcada por grandes desfiles, samba no pé e carrega em si muito significado. Talvez as novas gerações não conheçam o Zé Carioca, criado por Walt Disney em 1940 - quando o próprio esteve no Brasil. Ele é parte da representação estereotipada brasileira no exterior até hoje, com a típica malandragem de um país selvagem em constante festa. Mas nós, que moramos no país tropical, sabemos que não é bem assim.


Este ponto de vista limitado é reproduzido a cada vez que recebemos estrangeiros em eventos, como um ‘ritual obrigatório’, mostrando o que “de melhor” o país pode oferecer. A saborosa caipirinha e a linda ‘mulata’ com samba no pé, formam uma combinação que funciona há anos, não é mesmo?


E qual seria o impacto sobre o uso do termo ‘mulata’ ou objetificação da mulher brasileira pelo viés inconsciente da construção idealizada do nosso carnaval no exterior? O país recebeu um número recorde de turistas em 2019, anos após a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa divulgar um estudo que aponta que aproximadamente 250 mil pessoas viajam todos os anos para o exterior com o objetivo de manter relações sexuais com menores de idade. Para muitos, as duas informações não se conectam, mas a realidade é outra.


Estamos em 11° lugar no rankingmundial de abuso e exploração infantil divulgado pela revista britânica The Economist em 2019 e somos o segundo país mais procurado para turismo sexual no mundo. Uma palavra que parece simples para muitos - como mulata - pode carregar um histórico de hiperssexualização e desumanização do corpo negro de um recente passado escravocrata.


Os comunicadores aprenderam em seus cursos de formação que a base dos significados de uma mensagem é feita da composição de elementos, como se fossem os tijolos de uma construção. Ao ouvirmos uma palavra acessamos o nosso sistema de crenças para darmos o significado a ela, sempre conectado a cultura do qual fazemos parte. Geralmente, é assim que nossas opiniões e experiências positivas ou negativas são formadas.

É importante tomarmos cuidado para não reforçarmos estereótipos, já que muitas vezes reproduzimos - mesmo que de modo inconsciente - o preconceito, permitindo situações alheias de discriminação.


Com isso, perdemos a oportunidade de ampliar as experiências, de marcar positivamente nosso público-alvo. É importante valorizarmos o melhor de cada experiência, respeitando a todos e contribuindo com a construção de pontes que incluem ao invés de segregarem.


É na escolha dos detalhes e com profundidade de conhecimento onde a diferenciação acontece na comunicação. Por isso, nosso papel como comunicadores é tão importante. Temos responsabilidade sobre a mensagem, nós influenciamos as relações humanas, criamos experiências que tornam vivas as memórias.


Que tal valorizar a cultura dos pavilhões, a força das comunidades, a poesia dos sambas-enredo? Que tal respeitarmos as mulheres, o corpo negro, as culturas e até profissões que não são as nossas nas fantasias que vestirmos para festejar? Sim, somos o país do carnaval, mas não por conta da malandragem do Zé Carioca.


O Brasil é o quarto país mais criativo do mundo, segundo pesquisa feita pela WARC Creative 100 realizada em 2019. Logo, é nossa responsabilidade ir muito além.


Raphael Pagotto, líder de projetos em inclusão e sustentabilidade na MCM Brand Group

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